Papo Aberto

Crescidinhos?! Desde quando?

Por Isabel Coelho

Estimativa de leitura: 3min 23seg

13 de maio de 2022

Crescidinhos é o novo documentário da Netflix que veio para abalar pais e mães ocidentais — ou, ao menos, brasileiros e brasileiras. Os curtos episódios, extraídos de um programa de televisão japonês, mostram crianças bem pequenas — às vezes de quase três anos — realizando tarefas consideradas bastante complexas para a idade. 

No programa, os pequenos são desafiados a realizar um percurso para cumprir alguns afazeres diários da família, como comprar produtos bem específicos no mercado do bairro ou levar encomendas aos vizinhos, por exemplo. É de fato impressionante a destreza com que as crianças se localizam no mapa do bairro, reconhecem alimentos e produtos, administram o tempo e tomam decisões. As situações mostradas reafirmam que crianças autônomas enfrentam de maneira segura os desafios que lhes são propostos (ou impostos). 

Salvaguardadas as diferenças socioculturais, o programa nos faz refletir sobre o quanto privamos nossas crianças de realizar tarefas do cotidiano com autonomia, simplesmente porque achamos que elas não são capazes de cumpri-las — e não lhes damos nem mesmo a oportunidade de tentar. 

Não raro, nos deparamos com uma situação análoga quando se trata de ofertar livros para pequenos leitores. É comum, por exemplo, partirmos do pressuposto de que crianças não alfabetizadas não sabem ler — como se a leitura de um livro se desse apenas por meio de palavras — e, desse modo, tornamos os livros elementos secundários na formação delas. 

Como objeto sensorial, um livro pode ser lido por meio dos cinco sentidos. Inicialmente, é um brinquedo que se desvela à medida que a criança desenvolve a visão e, posteriormente, vai ganhando novos contornos e funções, com a chegada da linguagem escrita. Assim, crianças leem desde o primeiro momento que um livro é colocado em suas mãos. Com a mediação de um adulto, elas são capazes inclusive de decorar uma história antes mesmo de saber reconhecer uma letra sequer. 

Outro equívoco bastante comum é achar que pequenos leitores não podem ser expostos a histórias que tratam de temas sensíveis — como morte, separação e traumas em geral. Por vezes, nós, adultos, nos esquecemos de que as crianças também têm sentimentos. Em muitos casos, elas não estão preparadas para organizar as emoções e sensações à luz dos fatos, o que torna uma boa história ainda mais fundamental, auxiliando-as a reconhecer e enxergar saídas para um momento difícil. Além disso, os livros e suas histórias se tornam uma porta aberta para o diálogo entre crianças e adultos. 

Subestimar crianças e julgar que elas não são capazes de realizar tarefas porque ainda são muito pequenas é privá-las de um direito fundamental do ser humano: conquistar autonomia diante dos próprios sentimentos. 


Isabel Lopes Coelho publisher de Literatura na FTD Educação. É também autora da obra A representação da criança na literatura infantojuvenil (Ed. Perspectiva, 2020), fruto da sua tese de doutoramento em Teoria Literária e Literatura Comparada da Universidade de São Paulo (USP). Em  2012, recebeu o prêmio BOP – Best Children’s Publisher of the Year, concedido na Feira do Livro Infantil de Bolonha. 
     Coelho participa de eventos internacionais como convidada e palestrante, como o Salon du Livre et de la Presse Jeunesse (Montreuil, Fança, 2006 e 2012), o Minimondi (Parma, Itália, 2007), o I Encuentro Latinoamericano de Editores de Libros para Niños e Jóvenes (Bogotá, Colômbia, 2009), o FIL Rights Exchange Programm (Guadalajara, México, 2017), o Rendez-vous de Québec Éditions (Montréal, Canadá, 2018) e Sharjah Book Conference (Sharja, Emirados Árabes, 2019). Participou do Programme Courants du Monde (Paris, França, 2012) e foi bolsista no Fellowship da Internationale Jugendbibliothek (Munique,Alemanha,2015). 
      A publisher também ministra cursos e palestras sobre literatura infantil e sobre o livro ilustrado
 

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