Entenda como relacionar filmes, livros e séries com os temas de redação. Aprenda o que é e como usar o repertório sociocultural.
Quer se preparar para o Enem? Que tal aproveitar tudo que você assistiu, leu ou vivenciou para dar um upgrade no seu repertório sóciocultural e arrasar na sua redação?
Filmes, séries, livros, histórias em quadrinhos, charges, peças de teatro, podcasts, museus, shows, músicas… todas as produções culturais que você consumiu e consome, fazem parte da sua bagagem cultural e podem ser usadas para desenvolver ou fundamentar uma ideia em um texto de redação.
Esta habilidade é cobrada na Competência 2 da redação do Enem, que avalia a compreensão do tema, a adequação do tipo textual e o uso de um repertório sociocultural produtivo, sendo essencial para que você consiga articular as suas ideias usando seu próprio conhecimento.
Para isso, é preciso que você use informações, fatos e situações que tenham respaldo nas áreas do conhecimento, sejam pertinentes ao tema e contribuam para a evolução do texto.
E para ajudar você a treinar essa habilidade e garantir um texto afiado no Enem e nos vestibulares, separamos várias dicas.
Para que serve o repertório sociocultural?
Para o professor de Língua Portuguesa, Teófilo Beviláqua, possuir um bom repertório sociocultural é um indício de que o estudante é um leitor, no sentido amplo de leitura. O repertório significa riqueza na fundamentação de argumentos e criatividade na construção de ideias para além do senso comum.
“Após o momento em que os estudantes se defrontam com o tema e leem os textos motivacionais, é chegado um instante decisivo, o pré-texto, em que são listadas possíveis ideias, tanto de cunho crítico (de posicionamento analítico) quanto de cunho informativo (essas oriundas de seu repertório sociocultural). O encontro entre criticidade e repertório sociocultural resulta em um conteúdo consistente, em uma argumentação potencialmente persuasiva e em uma excelente pontuação. Isto também é verdadeiro para outras tipologias textuais, como a narrativa, visto que o contato com textos narrativos e a leitura deles forja uma consciência estrutural e o aguçamento da criatividade”, ressalta o professor.
Como treinar o repertório sociocultural?
Para ficar mais fácil de lembrar o repertório na hora da prova, comece a anotar os filmes, os livros, as séries e as demais produções culturais que consome e tente relacionar o conteúdo de cada um a possíveis temas de redação.
Fique de olho em produções culturais que sigam a natureza dos temas do Enem, sobretudo os de ordem social, que predominaram nos últimos dez anos.
É importante estar atento também às notícias, pelo menos, de um ano para cá e ler textos argumentativos (de opinião) publicados ou transmitidos pela imprensa. Também vale acompanhar podcasts de debates.
E você não precisa fazer isso sozinho! Chame os amigos ou a família para uma sessão de cinema/maratona de séries/clube do livro e em seguida debatam sobre o que assistiram ou leram, refletindo sobre os temas abordados e trocando percepções sobre a obra.
Aproveite para tomar nota de trechos ou cenas que chamaram a sua atenção e os insights que você teve podem ajudar a contextualizar uma ideia. Bora tirar nota mil na redação do Enem?
Como usar repertório sociocultural na redação?
“Não se pode apresentar repertório por apresentar. Ele deve produzir um efeito constitutivo e construtivo da ideia, do argumento.”
Agora que você já sabe como treinar para aproveitar os conteúdos que consome na hora de contextualizar um tema de redação, é preciso entender qual é a melhor maneira de fazer essas correlações.
Segundo o professor Teófilo, a palavra de ordem, nesse sentido, é seletividade produtiva ou, simplesmente, produtividade. É preciso coerência entre o que está sendo citado, mencionado, parafraseado, intertextualizado. Em bom português, isso significa que você não pode começar um texto dissertativo-argumentativo citando a frase de um filme, ou a cena de uma série, que nada tenham a ver com o tema ou com a problemática sugerida.
“Não se pode apresentar repertório por apresentar. Ele deve produzir um efeito constitutivo e construtivo da ideia, do argumento. Ele deve ajudar a dar coerência o parágrafo de introdução ou de desenvolvimento, fortalecendo-os e levando os corretores a pensarem: Olha que interessante a relação entre a menção ao conteúdo desse filme e a problemática desse tema, como esse estudante conseguiu dar coerência e potência à sua argumentação com essa referência sociocultural”, explica o professor.
Exemplos de repertório sociocultural no Enem
2022: No Enem 2022, duas estudantes que conquistaram nota 1000 citaram o mesmo documentário: “Guerras do Brasil.doc” para contextualizar o tema “Desafios para a valorização de comunidades e povos tradicionais no Brasil”.
“O documentário ‘Guerras do Brasil’, que tem participação do ativista indígena Ailton Krenak, apresenta, em seu primeiro episódio, a perspectiva dos povos originários em relação ao processo de colonização brasileiro, ressaltando a manutenção da luta dessas comunidades pela conservação da cultura e da preservação da natureza na atualidade. A partir desse cenário, é necessário avaliar os obstáculos que impedem a valorização efetiva dos povos tradicionais no Brasil, o que está associado à relação conflituosa com o modelo econômico agroexportador brasileiro, bem como à visão de parte da sociedade que inferioriza organizações sociais que se diferenciam do padrão ocidental”. (Trecho da redação de Giovana Fantoni Guimarães Castro, no Enem 2022).
“Na minissérie documental ’Guerras do Brasil.doc’, presente na plataforma Netflix, o professor indígena Ailton Krenak propõe a reflexão acerca da dizimação dos povos originários a partir de perspectivas atuais, em que é retratada a história sob o olhar do esquecimento e da violência contra esses povos, a despeito da sua riqueza cultural e produtiva. Estas formas de desvalorização das comunidades tradicionais do Brasil são respaldadas, dentre outros fatores, pela invisibilização histórica desses atores sociais no ensino básico e pelo preconceito que rege o senso comum. Desta forma, é imprescindível a intervenção sociogovernamental, a fim de superar os desafios mencionados”. (Trecho da redação de Ana Alice Teixeira Freire, no Enem 2022).
Em 2020, para abordar o tema “O Estigma associado às doenças mentais na sociedade brasileira”, uma estudante citou o filme “Coringa” (Joker, 2019).
No filme estadunidense ‘Joker’, estrelado por Joaquin Phoenix, é retratado a vida de Arthur Fleck, um homem que, em virtude de sua doença mental, é esquecido e discriminado pela sociedade, acarretando, inclusive, piora no seu quadro clínico. Assim como na obra cinematográfica abordada, observa-se que, na conjuntura brasileira contemporânea, devido a conceitos preconceituosos perpetuados ao longo da história humana, há um estigma relacionado aos transtornos mentais, uma vez que os indivíduos que sofrem dessas condições são marginalizados. Ademais, é preciso salientar, ainda, que a sociedade atual carece de informações a respeito de tal assunto, o que gera um estranhamento em torno da questão”. (Trecho da redação de Adrielly Clara Enriques, no Enem 2020).
Já no Enem 2023, para desenvolver o tema “Desafios para o enfrentamento da invisibilidade do trabalho de cuidado realizado pela mulher no Brasil’, uma estudante citou o livro Quarto de Despejo (diário de uma favelada), de Carolina Maria de Jesus.
“O livro Quarto de Despejo (diário de uma favelada), escrito por Carolina Maria de Jesus na década de 1950, narra as vivências da autora na favela do Canindé e suas dificuldades para obter sozinha o sustento de seus três filhos. De maneira análoga, cerca de setenta anos após a publicação do diário, a realidade enfrentada por Carolina permanece no Brasil contemporâneo, visto que o trabalho de cuidado realizado por mulheres, apesar de extremamente importante para a sociedade nacional, continua invisibilizado. Diante disso, cabe refletir acerca do legado histórico patriarcal e da intensificação das desigualdades para compreender os desafios que impedem a valorização do serviço feminino de assistência”. (Trecho da redação de Maria Laura Klein, no Enem 2023).
Mas não são apenas documentários, filmes ou livros que podem ser usados para contextualizar um assunto, lembre-se que o repertório é a sua bagagem cultural.
No Enem de 2014, por exemplo, uma estudante obteve nota máxima mencionando o desenho animado Peppa Pig, relacionando ao tema “Publicidade Infantil em questão no Brasil”. Em entrevistas, ela comenta que citou o desenho porque notou que os primos pequenos imitavam os personagens e pediam produtos de presente.
“Uma criança imitando os sons emitidos por porcos já foi atitude considerada como falta de educação. No entanto, após a popularização do programa infantil Peppa Pig, essa passou a ser uma cena comum no Brasil. O desenho animado sobre uma família de porcos falantes não apenas mudou o comportamento dos pequenos como também aumentou o lucro de uma série de marcas que se utilizaram do encantamento infantil para impulsionar a venda de produtos relacionados ao tema. Peppa é apenas mais um exemplo do poder que a publicidade exerce sobre as crianças”.(Trecho da redação de Larissa Freisleben, no Enem 2014).
Para resumir, a dica de ouro ao usar o repertório sociocultural é: ser coerente para ser produtivo, ser produtivo para ser convincente e ser convincente para obter êxito.
Para não errar fazendo citações no Enem
Se você perceber que o conteúdo da série/livro/filme que você consome se encaixa perfeitamente na introdução ou no parágrafo de desenvolvimento do seu texto, tenha muita calma nessa hora!
Além de ser coerente e de se valer de informações efetivamente válidas, tome cuidado na hora de citar a produção cultural para não se estender e ocupar mais linhas do que o necessário.
“O bom texto não é bom porque tem muita citação, alusão a filmes e séries, dados estatísticos, referências históricas etc. O texto argumentativo, por exemplo, é bom porque argumenta e é persuasivo, e essa persuasão é potencializada pelos recursos do repertório sociocultural”, relembra o professor Teófilo.
É hora de maratonar!
Confira algumas sugestões para ampliar e treinar o seu repertório sociocultural:
1.Filmes para repertório sociocultural
- Racionais: das ruas de São Paulo para o mundo;
- Que horas ela volta?;
- Central do Brasil;
- Bacurau;
- O Auto da Compadecida;
- Olga;
- O que é isso, companheiro?;
- Adeus Lênin;
- O show de Truman;
- A Lista de Schindler;
- Invictus;
- Parasita.
2.Documentários para repertório sociocultural
- Guerras do Brasil (Netflix);
- Solo fértil (Netflix);
- O Dilema das Redes (Netflix);
- David Attenborough e nosso planeta (Netflix);
- Lixo Extraordinário (YouTube).
3.Séries para repertório sociocultural
- Como se tornar um tirano (Netflix);
- Chernobyl (HBO Max/Prime Video);
- Black Mirror (Netflix);
- Merlí (Netflix);
- Olhos que condenam (Netflix);
- Maid (Netflix);
- O Conto da Aia (Prime Video).
4.Livros para repertório sociocultural
- Quarto de Despejo (diário de uma favelada), Carolina Maria de Jesus;
- Capitães de Areia, Jorge Amado;
- Torto Arado, Itamar Vieira Junior;
- Clara dos Anjos, Lima Barreto;
- Pequeno Manual Antirracista, Djamila Ribeiro;
- Americanah, Chimamanda Ngozi Adichie;
- A Revolução do Bichos, George Orwell;
- O Povo Brasileiro, Darcy Ribeiro;
- A Vida Não É Útil, Ailton Krenak;
- Sociedade do Cansaço, Byung-Chul Han;
- A Metamorfose, Franz Kafka;
- Modernidade Líquida, Zygmunt Bauman;
- O Príncipe, Nicolau Maquiavel.
Temas de redação que já caíram no Enem
- Desafios para o enfrentamento da invisibilidade do trabalho de cuidado realizado pela mulher no Brasil (2023).
- Desafios para a valorização de comunidades e povos tradicionais no Brasil (2022).
- Invisibilidade e registro civil: garantia de acesso à cidadania no Brasil (tema do Enem impresso e digital) (2021).
- O estigma associado às doenças mentais na sociedade brasileira (2020 – Enem impresso).
- O desafio de reduzir as desigualdades entre as regiões do Brasil (2020 – Enem digital).
- Democratização do acesso ao cinema no Brasil (2019).
- Manipulação do comportamento do usuário pelo controle de dados na Internet (2018).
- Desafios para a formação educacional de surdos no Brasil (2017).
- Caminhos para combater a intolerância religiosa no Brasil (2016).
- A persistência da violência contra a mulher na sociedade brasileira (2015).
- Publicidade infantil em questão no Brasil (2014).
- Efeitos da implantação da Lei Seca no Brasil (2013).
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