Nestes mais de 20 anos trabalhando com a temática de Projeto de Vida, me sinto cada vez mais convicto em apontar que é a presença consciente e comprometida de um projeto vital o elemento transformador de uma vida. Pense, tudo que dá certo na vida tem, em maior ou menor grau, um planejamento, um protocolo, um estilo, um aprendizado constante, enfim, um projeto. Isso vale para a carreira de um atleta, para um prédio bem construído, para uma metodologia de ensino consagrada, para uma carreira profissional.
Claro que há sempre espaço para improvisos e ajustes ao longo do processo, mas como diria uma frase atribuída a Abraham Lincoln, “falhar em planejar é o mesmo que planejar falhar”.
Diante das mudanças tão intensas que temos visto nos estudantes, nas famílias, na sociedade, em nossas vidas, meu convite é para você gestor, líder, mantenedor, você que tem algum poder de decisão sobre o planejamento político-pedagógico de sua escola para o próximo ano. Dentro de poucas semanas começam importantes reformas na quadra, nas salas de aula, ampliações, ajustes, diminuições ou mesmo a instalação de novas tecnologias.
Lembre-se de colocar dentro de seu orçamento e planejamento a formação continuada dos profissionais de sua instituição, afinal, se queremos estudantes inspirados, motivados, disciplinados, orientados e realmente engajados, é preciso entender que nossos professores, os principais protagonistas do processo educativo, aqueles que realmente fazem a mágica acontecer, também são estudantes.
Vivemos hoje um mundo cada vez mais exigente, com famílias cada vez mais demandantes, estudantes com questões sociais e emocionais cada vez mais frágeis, então não é possível educarmos os estudantes de hoje com as mesmas ferramentas de 5, 10 ou 20 anos atrás. Se não for tomada uma posição clara e consistente para formar e reformular o pensar, o sentir e o agir dos professores da escola, caímos no perigo de no lugar de uma ótica empreendedora e transformadora, nos perdermos na neuro-ótica, aquele desejo de que as famílias ou os estudantes, ou seja, o outro, se torne prontamente adaptado à nossa realidade.
É claro que há professores que natural e individualmente continuam lendo, fazendo cursos e se aperfeiçoando, mas isso pode ser muito potencializado se na escola em que trabalham, tiver alguma destas frentes que elenco abaixo:
- Imagine a leitura conjunta de alguma obra selecionada pelos próprios professores ou pela liderança. Existem diversos livros que abordam teorias, metodologias ativas, reflexões sobre o mundo atual e em encontros mensais ou bimensais pode-se explorar capítulo a capítulo para que se tenha unidade e coerência de olhares e atitudes;
- É possível fazer rodas de conversa em que os educadores tragam livros de suas escolhas ou sugeridos pela liderança e apresentem aos colegas em esquema de seminários suas ideias, inspirações e propostas para que os demais percebam não apenas os conteúdos, mas também a forma como os colegas os compartilharam;
- Formações contínuas sobre temáticas importantes que nem sempre estão presentes durante a capacitação docente. Temas como carisma, expressão em público, oratória, habilidade de negociação, criatividade, conhecimento de novas tecnologias, domínio de habilidades de resolução de conflitos, comunicação assertiva, entre outros. Tudo isso pode fazer uma diferença incrível em uma reunião com famílias, na hora de resolver um conflito no intervalo ou mesmo durante diferenças que aconteçam entre os próprios profissionais da equipe, afinal, cuidamos muito dos problemas e dificuldades entre os estudantes, mas quando nos dirigimos aos professores para ajudá-los a lidar com suas próprias questões, seus relacionamentos ou com a integração entre as equipes (fator altamente impactante no bem-estar, na saúde mental e até nos resultados da instituição)?;
- Existem parcerias que podem ser feitas com instituições de ensino. Se perto de sua escola houver uma faculdade de Psicologia, Nutrição ou Fisioterapia por exemplo, que tal propor que estudantes de último ano venham fazer intervenções pontuais ou sistemáticas para cuidados com seus professores? É sabido que professores bem cuidados tendem a cuidar melhor de seus estudantes. Humanizando os educadores ganha-se em potência, em engajamento, em felicidade e consequentemente nos resultados;
- Formação de duplas ou trios para compartilhamento de boas práticas é uma ação bastante impactante e transformadora. Isso significa criar uma sistemática em que ao longo do semestre, um professor assista uma ou algumas aulas de seus colegas e depois conversem sobre o que um aprendeu com o outro. Sabemos que todo profissional tem suas qualidades e também suas limitações. Na medida em que há um aprendizado entre pares, além do fortalecimento do senso de equipe, há uma multiplicação de saberes, além de um acolhimento recíproco e a oportunidade de perceber dificuldades grupais que podem ser cuidadas em formações gerais ou em conversas orientadoras;
- Trazer familiares que abordem a temática da saúde mental pode gerar um grande impacto. Certamente em sua escola existem sociólogos, psicólogos, filósofos que podem trazer reflexões para ajudar os educadores com nossas questões humanas: solidão, dor, ansiedade, conflitos, sonhos, esperança e medos. Todos esses temas podem ser abordados em encontros nos quais pais ou mães de estudantes tragam inspirações para os educadores e, com isso, haja não apenas uma integração de saberes, mas uma conexão entre humanos que têm a mesma missão;
- Formar um comitê de saúde mental entre os educadores é outra estratégia interessante. Se cada professor, dentro de sua área de conhecimento, trouxer contribuições sobre ansiedade, medo, angústia, solidão, podemos fazer um grande trabalho. Imagine o professor de Matemática trazendo uma reflexão sobre o número de questões de saúde mental entre profissionais da Educação ou entre estudantes e o que podemos fazer com isso. Imagine, por exemplo, o professor de História pesquisando uma linha do tempo sobre como em diferentes momentos históricos as questões emocionais foram abordadas. Ou profissionais da área de Literatura trazendo textos que versem sobre as dores da alma ou sobre a felicidade. Da mesma forma, um professor da área de Exatas pode trazer insights sobre Educação Financeira, e assim, ao longo do ano, diversos profissionais de áreas afins ou complementares vão alimentando os colegas sobre temas tão humanos, atuais e necessários. Com isso, a escola vai reforçando a atitude de aprendiz, uma percepção de que somos todos seres em plena transformação, em formação permanente.
Como gosto de frisar, o futuro não está posto, não está garantido e muito menos condenado. Escrevemos nossa história sempre a lápis e quando menos esperamos, coisas maravilhosas ou situações muito adversas podem acontecer. Diante de uma realidade cada vez mais instável e desafiadora, é fundamental o acolhimento, a inspiração e o aprendizado contínuo daqueles profissionais que fazem, volto a dizer, a mágica acontecer. Afinal de contas, professores encantados encantam. Professores motivados motivam.
Neste momento em que começam os planejamentos e reformas para o próximo ano, inicie a sua reflexão por aqueles que mais impactam na vida de toda a comunidade escolar, mostre gratidão por aqueles que dedicam horas fundamentais de sua vida, anos fundamentais de sua existência para fazer da escola uma instituição que respira vida, que transforma vidas e que zela por elas. Tudo que é vivo muda e está em movimento.
E você, o que pode mudar hoje para começar a ter no próximo ano uma postura mais humanizada e humanizadora? Mais acolhedora e transformadora com seus educadores?